A Gestação do “Portinglês”
A invasão inexorável
do idioma imperial transformará a língua no Brasil?
Há quem tema que a influência do inglês no português venha a
gerar mutações linguísticas no futuro.
Primeiro viria o portuglês, depois o portunglês, em seguida o portinglês e por
fim o pinglês. Exagero, claro, mas com o ensino promovido no país, talvez menos
impossível do que se imagina. Mais fácil, por exemplo, o sertão virar mar e a Amazônia,
sertão- coisas que já se tornaram possibilidade no Brasil: o mar no sertão pela
planejada transposição do São Francisco; e o sertão na Amazônia da seca.
É natural que as línguas recebam a influência do idioma mais
importante do Ocidente.
Quanto mais receptivas, como o poroso e saltitante português
do Brasil, mais influência recebem. E nem é preciso lembrar que a maioria das
inovações científicas e tecnológicas já nasce batizada em inglês. Mas o fato é
que já se notam sinais do que se poderia chamar de
"portuglês" em certas áreas. É olhar ao redor,
ouvir conversas mercantis ou ler revistas e jornais.
Uma manchete gritava que "Negócios com delivery crescem
em SP". Assim, sem destaque gráfico para a palavra delivery, como se ela
fosse freguesa dos dicionários. (Já há delivery order, carta que autoriza a
entrega de mercadorias.)
Delivery surge sem destaque em faixas de pizzarias ou casas
de comida chinesa, e ninguém se surpreende, porque o país está aberto às
novidades mais edificantes. Nada de mal em recebê-las, e os espíritos
resignados ante a realidade global devem até considerar delivery mais bonito e
mais significativo do que "entrega" ou "entrega-se em
casa".
No texto deliveroso havia também o atendimento ao cão doente
e ao dono doente do cão. Home Doctor é o nome de uma empresa que atende os
sem-saúde em aflição. E Dog
Doctor a que acode cães, gatos e papagaios, naturalmente.
Para donos depauperados, que precisem de trato superficial, há a Kiron Advanced
Medical Center. No Alabama? Não, em São Paulo. (...)